DO FIM PARA O COMEÇO
Num entardecer de um dia,
como qualquer outro, Joana encontrava-se
sentada num alto de um mirante para contemplar o pôr do sol. Aquele era
um momento sagrado. O local era
pouco visitado pelas demais pessoas, pois diziam que, embora a vista fosse
apreciável, havia uma melancolia predominante, e a maioria das pessoas não
sabem ver o lado bom daquilo que só aparenta ser ruim. Mas Joana não se sentia
triste naquele ambiente, pelo contrário, ela sentia-se mais viva, mais
revigorada, era com se a natureza a fortalecesse. Eram as essências integradas
no mesmo ser.
Enquanto ela estava
perplexa a acompanhar os movimentos do sol realizando seu ofício de partida,
alguém sentara ao seu lado. Ela nem ao menos vira a chegada desse alguém. Até
que ouve uma voz:
− Fim de tarde bonito, não
é? O homem falou.
A menina assustou-se e um
tanto receosa, responde:
− É um belo anoitecer.
O homem sorriu e ficou em
silêncio.
A jovem parecia longe, de olhos fixos no
horizonte. Até que um pássaro pousa em sua frente. Ela sorri tão contente, como
se ave estivesse ali para vê-la. O homem olha atento aquela cena, sem que Joana
perceba. Mas o pássaro levanta voo e parte. A
jovem fica com um semblante triste, como se estivesse sido abandonada. O homem
então pergunta:
− Ficaste triste com a
partida do passarinho?
A jovem dar um suspiro de
lamento e responde:
− Não exatamente pela
partida dele, mas pela ausência que ficou. Ela silencia por instante e
continua.
− Sempre venho aqui para
apreciar o pôr do sol. Daqui a visibilidade é melhor e o espetáculo fica mais
emocionante. Fico diante desta obra divina em contemplação. Vou me embalando
nos raios do sol até eles sumirem por detrás da montanha. Por mais que este
seja um hábito contínuo, é sempre como a primeira vez. Contudo, mesmo diante de
uma beleza tão radiante não há ninguém ao meu lado a quem eu possa dizer: “− Veja!
Como é lindo!”. Isso acaba me causando uma dor, a dor da solidão, a dor do
abandono...
Nesse momento, as lágrimas
começam a rolar na face de Joana. O homem comovido oferece o lenço a ela e diz:
− Não sei por quanto tempo, mas posso lhe fazer companhia nos entardecer, caso
queira.
A menina pega o lenço
enxuga as lágrimas, levanta o semblante e pergunta:
− Mas em troca de que o
senhor fará isso? Eu nem o conheço?
O homem responde: − Em troca da sua alegria,
da sua amizade, da sua companhia. Sinto mais vivo quando me sinto útil. E
quanto ao fato de não nos conhecermos, permita-me que eu me apresente. Ele
levanta a voz e diz em tons firmes e simpático:
− Sou Miguel Arcanjo. Tenho
nome de anjo, mas sou mais humano que angelical. A jovem já mais animada responde:
− Muito prazer, senhor
Miguel. Sou Joana Campbell, esta chorona aqui. Os dois riem da situação e no
horizonte surge a primeira estrela.
Joana então fala:
− Bom, senhor Miguel, a
noite já vem iniciando. Devo descer do céu e retirar-me da presença de um anjo
para voltar à terra. O senhor me acompanha? Mas tem que ir andando. Nada de
voar. Miguel não contém o riso e responde:
− Que ótimo humor você tem!
Acompanho-a sim e prometo manter os pés no chão.
Os dois se retiraram
daquele mirante para no amanhã retornar. Joana só não lembrava que o Miguel era
o mesmo homem que testemunhava suas fugas, quando pequena, para o mirante em
todos os fins de tarde.
Miguel havia ido morar em outra cidade e só
voltou a esta após dez anos. Só reconheceu Joana pelo sinalzinho negro que ela
tem na bochecha, e por esta não ter perdido o jeito travesso e o hábito de
contemplar no alto do mirante.
Iúllia Agner
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