sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Resenha #23 Macunaíma (Mário de Andrade)


¡Hola! ¿Como están, chicos?

Hoje trago uma obra incrivelmente nacional, Macunaíma, de Mário de Andrade.
Para quem já leu, sabe que é AQUELE livro...
Um livro que te faz rir, dar gargalhadas, dor de barriga de tanto achar graça...


Macunaíma, a quem Mário de Andrade se refere como o herói “sem nenhum caráter”, é uma das mais conhecidas personagens da literatura brasileira. Nascido na tribo dos tapanhumas, índios negros do interior da Amazônia, este “herói” desde criança mostra-se rebelde: 

Já na meninice fez coisas de sarapantar. […] O divertimento dele era decepar cabeça de saúva. Vivia deitado mas si punha os olhos em dinheiro, Macunaíma dandava pra ganhar vintém. E também espertava quando a família ia tomar banho no rio, todos juntos e nus. (p. 2) 

Seu nascimento já foi, por demais, grotesco. Andrade inicia sua narrativa de uma forma sublime, por assim dizer: “No fundo do mato-virgem nasceu Macunaíma, herói de nossa gente” (p. 2). A essas palavras, faz o leitor remeter ao início de outra narrativa: “Além, muito além daquela serra, que ainda azula no horizonte nasceu Iracema” (ALENCAR, Iracema, p. 20). Mas, ao contrário de José de Alencar, que na frase seguinte descreve a heroína como “a virgem dos lábios de mel, que tinha os cabelos mais negros que a asa da graúna, e mais longos que seu talhe de palmeira” (ALENCAR, Iracema, p. 20), Mário de Andrade traz para nós um estranhamento cômico a Macunaíma e a seu nascimento: 

Era preto retinto e filho do medo da noite. Houve um momento em que o silêncio foi tão grande escutando o murmurejo do Uraricoera, que a índia, tapanhumas pariu uma criança feia. Essa criança é que chamaram de Macunaíma. (p. 2).


Esses comentários grotescos e humorísticos ao mesmo tempo, se desenvolvem em toda a narrativa. Cada página da obra é composta por essa extravagante forma de literatura. 

Quando criança, não falava (pois só quando quase completara seis anos, deram água no chocalho para ele beber), mas aprontava por demais: 

No mucambo si alguma cunhatã se aproximava dele pra fazer festinha, Macunaíma punha a mão nas graças dela, cunhatã se afastava. Nos machos guspia na cara. […] Quando era pra dormir trepava no macuru pequeninho sempre se esquecendo de mijar. Como a rede da mãe estava por debaixo do berço, o herói mijava quente na velha, espantando os mosquitos bem. Então adormecia sonhando palavras-feias, imoralidades estrambólicas e dava patadas no ar. (p. 2). 

Sua forma de crescimento é extraordinariamente estranha: “assim que deitou o curumim nas tiriricas, tajãs e trapoerabas da serrapilheira, ele botou corpo num átimo e ficou um príncipe lindo” (p. 3). E assim foi crescendo, e sempre que saía com a companheira de Jiguê (seu irmão), que era uma espécie de feiticeira, “brincava” (termo utilizado pelo autor para designar uma relação sexual.) com ela e crescia mais: “Quando o botou nos carurus e sororocas da serrapilheira, o pequeno foi crescendo foi crescendo e virou príncipe lindo. […] Nem bem o menino tocou no folhiço e virou num príncipe fogoso” (p. 3-4) até que sua mãe “botou o curumim no campo onde ele podia crescer mais não” (ANDRADE, p. 9). 

Em uma de suas “brincadeiras” com Sofará, o escritor expõe ao leitor cenas extravagantes, grotescas com um tom de antropofagia (canibalismo):

Quando Sofará veio correndo, ele deu com o pau na cabeça dela. Fez uma brecha que a moça caiu torcendo de riso aos pés dele. Puxou-o por uma perna. […] Então a moça abocanhou o dedão do pé dele e engoliu. Macunaíma chorando de alegria tatuou o corpo dela com o sangue do pé. […] porém do galho baixo em riba dele furou o silêncio o miado temível da suçuarana. O herói se estatelou de medo e fechou os olhos pra ser comido sem ver. […] era a moça. Macunaíma principiou atirando pedras nela e quando feria, Sofará gritava de excitação tatuando o corpo dele em baixo com o sangue espirrado. Afinal uma pedra lascou o canto da boca da moça e moeu três dentes. Ela pulou do galho e juque! tombou sentada na barriga do herói que a envolveu com o corpo todo, uivando de prazer. E brincaram mais outra vez. (p. 5). 

Em outra passagem Macunaíma come um pedaço da perna do Curupira: “Cortou carne da perna moqueou e deu pro menino” (p. 10) porém, “o Currupira estava querendo mas era comer o herói” (p. 9) e montou no veado, que é seu cavalo e saiu a gritar: “— Carne de minha perna! carne de minha perna! Lá de dentro da barriga do herói a carne respondeu: — Que foi?” (p. 10). 

Com certa violência conquista Ci, a “mãe do mato” ou “imperatriz dos icamiabas” (tribo formada por índias amazonas): “O herói apanhava. Recebera já um murro de fazer sangue no nariz e um lapo fundo de txara no rabo” (p. 13). Macunaíma passa, após “possuir” Ci, a imperar sobre seu território. 

Ao morrer, Ci deixa de presente a Macunaíma todo o seu império e uma muiraquitã, um amuleto de pedra verde que devia ser incrustrado no lábio inferior. Porém, distraído, acaba por perder a muiraquitã e a maior parte da narrativa, então, passa a discorrer sobre as peripécias de Macunaíma e seus irmãos Jiguê e Manaape, na procura do amuleto, que se encontra em São Paulo, no poder de um gigante chamado Vencelau Pietro Pietra. 

Um traço interessante na obra é que o herói Macunaíma morre. E como já era de se esperar, isso acontece de uma forma bem inverossímil. “Macunaíma agachou com a flecha enterrada no coração […] e Macunaíma já tinha morrido” (p. 31). Mas sua morte não dura muito, pois logo ressuscita.

Mas essa não foi sua única morte, o herói “muito safado e sem caráter” (p. 101) “firmou bem o paralelepípedo e juque! nos toaliquiçus. Caiu morto” (p. 94). Após sua morte, desce do céu uma chuva que refresca a carne do herói, fazendo com que não haja putrefação. 

Mário de Andrade traz em sua obra toda a cultura brasileira. Em tons grotescos, mas bem humorísticos, desperta o interesse e prende a atenção de quem a lê. Seus fatos são absurdos e inverossímeis, uma narrativa que se produz na literatura fantástica, pois carrega o bizarro, o ridículo, ao mesmo tempo em que traz, também, o cômico, o burlesco bem como o extraordinário. 


Para quem se interessa por Arte Cinematográfica, há também o filme, antigo, mas tão engraçado quanto o livro. Porém, prefiro o livro. Prefiro ficar com a minha imaginação das cenas, do que vê-las explicitamente na tela (porque aparecem explicitamente, sim).



Vale à pena ler, com certeza!!!!!!!!
Leria trinta vezes se preciso fosse!!!
Quer "bolar de rir", literalmente?! Leia Macunaíma!!


Uma riqueza para a aquisição de conhecimentos acerca da cultura brasileira, tradições, superstições...  loucuras da nossa gente...
Altamente recomendado para quem anda com resquícios de tristeza....



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Mário de Andrade foi um grande incentivador do resgate à cultura brasileira. Foi um dos autores mais versáteis da literatura brasileira, pois atuou como poeta, ficcionista, crítico, ensaísta, folclorista, músico, fazendo com que viesse a ser a inspiração, o farol a guiar outros escritores modernistas. Mário ligou-se intimamente às pesquisas folclóricas. Buscava nelas o conhecimento do caráter do homem brasileiro, fazendo de suas obras um meio de compromisso social, pois acreditava que a literatura era um instrumento de conscientização da população, e, como bem se espera, de desalinhamento do ser.

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